Falsa Loura


A crítica superestimou esta grande porcaria e é muito difícil entender o porquê de tantos elogios rasgados ao cinema de Carlos Reichenbach. Depois do tenebroso “Garotas do ABC”, o diretor serve-se mais uma vez de um grupo de operárias de uma metalúrgica para discutir o cotiadiano destas mulheres cheias de sonhos e ilusões.

Percebe-se que o “clube da Luluzinha” se sacrifica durante o dia trabalhando pesado na fábrica, mas por mais que deixem toda vaidade na hora de vestir o macacão do uniforme, elas não dispensam de sair à noite todas emperequetadas. Silmara é uma delas, e acredita que sua “loirice” ajuda a seduzir os rapazes. Aos poucos, ela vai sendo usada e abusada pelos homens – uma “falsa loira” como diz o título.

O filme não consegue trabalhar nenhum dos temas que se propõe: o dia-a-dia na fábrica de mulheres comuns, trabalhadoras e jovens ou então a história de Silmara. O que fica em evidência é o amadorismo da produção, como as atuações sofríveis. Pra se ter uma noção, Maurício Mattar, Suzana Alves, a Tiazinha do extinto Programa H, e Léo Aquila, o transformista da Rede TV, são alguns dos atores do longa. Já perto do final, a trama recebe uma reviravolta surpreendente e acha que o espectador vai engolir a tentativa de ser “cult”. Tá de palhaçada!

O melhor do projeto é Rosane Mulholland (do interessante “A Concepção”). A atriz que interpreta a Silmara dá um show perante um filme perdido de intenções.

Nota: 4,0

A Duquesa


Eis aqui um legítimo filme de época! “A Duquesa” não se passa durante guerra alguma, nem tão pouco contém duelos ou a morte de um personagem importante para a trama. A calmaria do roteiro serve para ir a fundo nos costumes do periodo e, consequentemente, nas normas da sociedade conservadora. O papel da mulher no âmbito social é um de seus principais temas, e para isso, utiliza a figura verídica da Duquesa para abordar o assunto.

A bela e remediada Georgiana casa-se com o rico Duque de Devonshire (Ralph Fiennes), um dos homens mais importantes da Inglaterra. Mais do que natural seria a esposa dar um herdeiro homem para o poderoso marido, mas não é o que acontece com Georgiana. Ela acaba tendo somente meninas e o duque termina procurando alento em outros lugares.

A protagonista é uma mulher esperta e que não se conforma com o machismo vigente, diferente das submissas esposas. Uma curiosidade é que a verdadeira duquesa era parente direto da Princesa Diana e as duas possuem muitos pontos em comum. O carisma da atriz Kiera Knightley também ajuda na comparação.

De 2005 pra cá, Kiera lançou quatro filmes que se passam entre os séculos 16 e 18, são eles: “Orgulho e Preconceito”, “Desejo e Reparação”, “Paixão Proibida” e este aqui – sem contar os capítulos da saga “Piratas do Caribe”. Parece que a atriz nasceu para interpretar mulheres que viveram neste periodo, já que suas melhores interpretações foram nos filmes recém citados. Neste último, ela também se sai bem e ajuda a mostrar como a personagem era muito à frente de seu tempo.


Nota: 7,4

O Escafandro e a Borboleta


Jean-Dominique Bauby, apelidado de Jean-Do, foi editor da revista Elle e transitava pelo badalado mundo das celebridades francesas. Repentinamente, aos 43 anos, sofreu um derrame que o deixou em coma durante três semanas. Ao despertar, descobriu-se incapaz de mexer qualquer parte do corpo – exceto o olho esquerdo. Na tentativa de comunicar-se com os médicos e familiares mais próximos, ele pisca uma vez para significar “sim” e duas vezes para “não”.

O diretor Julian Schnabel retrata em “O Escafandro e a Borboleta” o processo de adaptação de um homem ativo e saudável a um estado de vida vegetativo e sem muitas perspectivas de melhora. Em uma das passagens do longa, o protagonista afirma em narração que além do olho, duas coisas não estão paralisadas: a sua imaginação e a sua memória. Embora esteja preso nessas limitadas condições, o cérebro funciona perfeitamente e não pára um segundo de maquinar.

Até os quarenta minutos iniciais o espectador enxerga somente através dos olhos do protagonista e a experiência é reproduzida de forma perfeita, trazendo o apreciador da película para o interior do personagem. Também presente no roteiro estão metáforas para exemplificar a situação dramática de Jean-Do, como quando o compara com uma borboleta presa nas garras de uma planta carnívora, ou ainda, quando faz o paralelo sutil entre o desmoronamento de falésias com o desmoronamento de sua vida.

O homem por trás do projeto, Julian Schnabel, foi premiado em Cannes como Melhor Diretor e o seu trabalho é realmente um primor. A obra é tão fantástica que supera com larga margem outra produção cuja temática é semelhante e além de tudo faturou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, “Mar Adentro”.

Em “O Escafandro e a Borboleta”, a irretocável edição alia-se com imagens explêndidas, principalmente quando os devaneios de Jean-Do são externados visualmente, como em sonhos ou lembranças – esta aí a imaginação e a memória novamente. Porém, tudo não faria sentido se não estivesse um brilhante ator no comando desta difícil transposição para as telas. Mathieu Amalric divide os méritos do projeto. É difícil mensurar o envolvimento e a dedicação com esta peça por parte de toda equipe, mas é fácil afirmar que o resultado obtido é um verdadeiro encanto, do início ao fim.

Nota: 9

Austrália


Após a obra-prima “Moulin Rouge”, a expectativa em torno do novo projeto de Baz Luhrmann aumentou e muito. O cineasta esteve envolvido na produção que contaria a história de Alexandre, o Grande mas, perdeu a batalha para o roteiro do drama de Oliver Stone. O projeto decorrente foi escrever e dirigir uma homenagem aos épicos do início do cinema, onde teria como pano de fundo o seu país de origem, a Austrália. Bom, infelizmente a tentativa não foi bem sucedida e o diretor saiu mais estropeado do que nunca.

“Austrália” tinha muito a seu favor: ótimos atores (Nicole Kidman e Hugh Jackman), uma equipe técnica de peso e um diretor cujo currículo é uma excelência. Pode-se apontar como o principal culpado deste imenso naufrágio o roteiro desequilibrado, que não se dá ao trabalho de resolver questões pendentes. O acúmulo de tramas tira a atenção do que primeiramente era o mais importante: aristocrata inglesa tem que assumir os negócios do marido que recém faleceu e, para isso, parte para uma fazenda no norte do país dos cangurus. Desde o princípio ela é ajudada por um boiadeiro, que acaba virando seu aliado na disputa por terra e gado na região. Soma-se ainda a presença de uma criança aborígene que conta a história.

O clima inicial de “Austrália” é de total empolgação. A aventura mistura-se com a comédia rasgada, nas quais as atuações são caricaturais e o que acontece na tela é propositalmente puro clichê. O caldo começa a desandar no momento que essa descontração e histerismo típico do diretor passa a ser levada a sério. A produção opta por estender-se demais em conflitos sem grande importância, como a misticismo, a Segunda Guerra Mundial e as crianças da “geração roubada” – temas mal desenvolvidos pelo roteiro.

O resultado pode ser irregular, mas a aposta em “Austrália” foi bastante alta, mais precisamente de 125 milhões de dólares, que não renderam nas bilheterias nem a metade. Para solucionar boa parte das contradições do longa, o ideal seria manter o timing cômico apresentado no início e deixar a cargo de outros atributos, como o deslumbramento gráfico e os toques inconfundíveis de Luhrmann, a contribuição para elevar o conceito do projeto. Talvez chegasse a ser um filme mais superficial, mas provavelmente, seria bem mais divertido.

Nota: 6,0

Queime Depois de Ler


Após o premiadíssimo “Onde os Fracos Não Tem Vez”, os irmãos Joel e Ethan Coen decidiram apostar em outro gênero que adoram: a comédia. Porém, suas investidas no formato são bastante diferentes do convencial, basta assistir “Fargo”, “Matadores de Velhinhas” e “O Amor Custa Caro”.

Com “Queime Depois de Ler” os irmãos diretores realizam um besteirol atípico, de piadas de canto de boca e trama curiosa. Na galeria de personagens, temos o analista da CIA despedido por alcoolismo, a personal trainer que sonha com cirurgias plásticas, um agente do Tesouro com mania de perseguição, e por aí vai. A situação non sense que se forma é hilária e quem brilha mais são os protagonistas: Brad Pitt é o melhor do projeto, seguido por uma histérica Frances McDormand.

O grande “senão” é que o filme nunca chega a decolar, ameaçando diversas vezes e por fim, não vai a lugar nenhum. Se for para entrar no humor dos Coen, este lançamento se resume a uma produção sofisticada sobre a estupidez humana, com boas atuações e personagens, mas que encontra dificuldade em dialogar com o grande público, principalmente, quando este está acostumado com tudo mais às claras.

Nota: 7,0

O Menino do Pijama Listrado


Por mais que pareça inocente em dados momentos, “O Menino do Pijama Listrado” demonstra em seu desfecho que a mensagem transmitida não tem nada de ingênua. A Segunda Guerra é observada pelo ponto de vista de duas crianças, uma que está dentro de um campo de concentração e outra que é filha de um comandante nazista. Um tema explorado em demasia, mas que ainda assombra o nosso passado.

Tão bom quanto a obra original, o filme é bem conduzido pelo diretor Mark Herman, que toma certas liberdades ao trabalhar o texto de John Boyne. O saldo bastante favorável pode ser creditado a forma modesta empregada que atinge em cheio o receptor. Pode ser considerado o “Caçador de Pipas” do ano.

Nota: 7,6

Bernard e Doris


Doris Duke foi uma influente filantropista, uma alcoólatra irrecuperável e considerada pela imprensa, durante muitos anos, a jovem mais rica do mundo. Na pele de Susan Sarandon, somos apresentados a uma protagonista excêntrica, herdeira da fortuna do pai empresário do ramo do tabaco e, que depois de tomar posse do dinheiro passou a ter plena convicção de que tudo tem seu preço. Essa teoria é posta a prova quando desenvolve uma forte amizade com o mordomo Bernand Lafferty (Ralph Fiennes).

As virtuosas performances de Sarandon e Fiennes elevam o caráter básico da história e são responsáveis pelo principal interesse na obra. Produzido pela HBO, foi indicado ao Globo de Ouro em três categorias: Melhor Filme Feito para a TV, Ator e Atriz em Telefilme. A produção faz questão de esclarecer que boa parte é baseada em fatos verdadeiros, sendo que algumas situações são fictícias.

Nota: 7,0

Dúvida


Muito mais que um filme sobre pedofilia, “Dúvida” levanta questões referentes ao posicionamento da igreja moderna e ainda faz uma análise sobre como surgem os boatos e as intrigas. O longa-metragem é baseado na peça de mesmo nome vencedora do prêmio Pulitzer.

A trama se passa em 1964, em um colégio católico americano quando uma freia acusa um popular padre de abuso infantil. O sucesso do filme deve-se a majestosa direção de John Patrick Shanley, que anteriormente foi responsável por “Joe e o Vulcão”. A contribuição do cineasta no projeto é essencial, dando um ritmo sério e de liberdades exatas para o tema. Os planos algumas vezes audaciosos, a edição seca e a bela fotografia também contribuem para a elegância visual.

Indicada ao Oscar pelo papel da irmã Aloysius, que rege a escola com mão de ferro, Meryl Streep encara mais um personagem icônico. Indescutivelmente, é uma das melhores performances da atriz. “Dúvida” completa seu elenco precioso com Phillip Seymor Hoffman, Amy Adams e Viola Davis – todos excelentes.

Nota: 8,0

Frost/Nixon


Logo após renunciar a presidência dos Estados Unidos, em 1974, Richard Nixon aceitou o convite feito por um apresentador de tv para uma série de entrevistas. A principal intenção do presidente era limpar a imagem negativa que havia deixado com o escândalo de Watergate. O episódio é retratado em “Frost/Nixon”, filme correto e surpreendentemente intrigante.

O diretor Ron Howard foge do padrão de que filme político tem que ser incompreensível e tedioso, e sendo assim, origina um conjunto harmonioso de dados históricos e entretenimento. A construção dos fatos é de fácil entendimento e rende muito mais do que a primeira vista aparenta.

O grande destaque vai para Frank Langella como o político controverso. Apesar de não ser parecido fisicamente com Nixon, o veterano ator demonstra uma entrega intensa a figura do presidente. A disputa fica interessante quando o entrevistador mostra-se bem mais astuto que o planejado.

Nota: 8,0

O Curioso Caso de Benjamin Button


Não há palavra melhor para definir o novo filme de David Fincher que “curioso”. Talvez seja por isso que ela está bem estampada no título da produção! A trajetória de um bebê com a aparência de um idoso que vai rejuvenecendo com o passar dos anos encantou o público e os críticos. Para completar, o filme foi recordista no Oscar 2009 com 13 indicações.

Ao ter como base um conto de poucas páginas de F. Scott Fitzgerald, o roteiro acabou obrigado a estender a narrativa, criando assim novas situações e desenvolvendo melhor a estranha faceta do protagonista. Por mais bizarro que possa parecer, o caso de Benjamin Button é muito bem explicado na tela e não deixa furos. As repostas que podem surgir antes de assistir o projeto são respondidas com êxito e, sem dificuldade, o espectador mergulha no universo singular da produção.

Dessa forma, assistimos a existência de um ser humano de trás para frente, e no caminho, muitos questionamentos são discutidos. O debate primordial é sobre a morte, seu fantasma sempre presente, explícito nos primeiros sinais do envelhecimento até a chegada inevitável. É por isso, que questionamos ser como Button: ao momento que vamos ficando mais jovens, ficamos também mais sábios. Não seria o ideal?

Há muito o que se aproveitar desta análise - também nos quesitos técnicos. David Fincher entrega uma obra mais acessível que seus projetos anteriores, como “Clube da Luta” e “Zodíaco”. A direção impecável mostra um diretor no auge da carreira e apaixonado pelo cinema. A direção de arte é fenomenal, assim como os fantásticos efeitos especiais, verdadeiras pérolas da tecnologia digital. Brad Pitt comprova mais uma vez seu talento e nos brinda com uma atuação fora do sério, principalmente quando encarna um velho de 80 anos.

Incrivelmente, o melhor momento do longa é seu início, quando observamos o nascimento de uma ser repleto de doenças que vai perdendo as rugas e ficando cada vez mais jovem. A parte da juventude não é de toda ruim, porém é mais fraca que as demais. Também não é nada que prejudique o andamento. Além de tudo, o filme é uma grande história de amor, sustentada pelo o que o cinema tem de mais rico. A paixão de Fincher pela obra transcende a tela e o resultado não poderia ser outro.

Nota: 8,5

O Leitor


Stephen Daldry acerta pela terceira vez consecutiva e engata mais uma obra de respeito. O filme recebeu uma série de indicações em festivais e arrecadou alguns prêmios, principalmente para Kate Winslet. O cineasta de “As Horas” conta uma história bastante interessante que mistura um romance “proibido” com questões referentes ao nazismo.

“O Leitor” pode ser dividido em três atos, sendo que o primeiro é, certamente, o melhor deles. O romance entre um jovem de quinze anos e uma mulher beirando os quarenta é tratado de forma sensual e sem preconceitos. A construção das imagens e da narrativa é de uma delicadeza sublime.

O segundo capítulo refere-se a grande revelação do longa, que por mais que tenha entregue o segredo muito longe do final, ainda reluta em deixar um clima de mistério. O último ato acontece na atualidade quando o protagonista é vivido por Ralph Fiennes e relembra sua infância e adolescência.

Não tem como negar que a força motriz do projeto é Kate Winslet, na interpretação de uma mulher amargurada e de atitudes duvidosas. O novato David Kross também surpreende com um carisma no ponto. “O Leitor” como produto é muito bem acabado, e como entretenimento é um filme sofrido.

Nota: 7,5