Oscar 2013: O ano de Argo



A noite em homenagem aos musicais colocou os atores para cantar e dançar, tirou sarro de cenas de nudez e reproduziu momentos marcantes de diversos filmes no palco do Dolby Theatre, durante a 85ª cerimônia do Academy Awards, ocorrida no último dia 24 de fevereiro. Com essa temática, a celebração ao gênero das danças e cantorias tentou induzir que o grande vencedor seria o seu único exemplar na disputa, "Os Miseráveis". Entretanto, a consagração terminou nas mãos de Ben Affleck, protagonista, diretor e produtor de “Argo”, thriller de ação que venceu nas principais categorias: Edição, Roteiro Adaptado e Filme. 


O comediante Seth McFarlane, criador de “Family Guy” e diretor da comédia sensação de 2012, “Ted”, estreou como apresentador do Oscar. Simpático e com bom timing, revigorou a premiação com seu humor  politicamente incorreto, além de demonstrar que sabe cantar muito bem, tanto em números solo quanto acompanhado de Daniel Radcliffe e Joseph Gordon-Levitt. Seu ápice foi logo nas boas-vindas, com uma série de comentários inspirados, como: “a história de ‘Argo’ é tão secreta que o diretor é desconhecido da Academia. Eles sabem que estragaram tudo. Ben, não é a sua culpa”, falando sobre a ausência de indicações para Affleck como Ator e Diretor.


Um dos melhores momentos da cerimônia foi a trinca de apresentações formada por Catherine Zeta-Jones cantando “All that jazz” ("Chicago"), Jennifer Hudson com “And I Am Telling You I’m Not Going” ("Dreamgirls") e o elenco de “Os Miseráveis” na interpretação de várias músicas do musical. Performances sensacionais, principalmente a última, de maneira tão grandiosa como o filme. Ainda na linha musical, Shirley Bassey deu voz ao clássico “Goldfinger” em homenagem aos 50 anos da série James Bond; Barbara Streisand subiu ao palco para um tributo, ao som de “The Way We Were”, em memória aos artistas que morreram no ano passado; Norah Jones não empolgou com “Everybody Needs a Best Friend” (Ted); e uma Adele apática cantou “Skyfall”, vencedora de Canção Original. 


Os filmes da edição
Com uma grande seleção fílmica concorrendo esse ano, o volume de estatuetas acabou se diluindo entre tantas produções indicadas. “As Aventuras de Pi” foi aclamado nas categorias técnicas, levando o maior número de prêmios: quatro. A surpresa da noite veio quando Ang Lee passou a perna em Steven Spielberg e levou como Diretor. O filme ainda arrecadou Fotografia, Efeitos Visuais e Trilha Sonora.


O vencedor da noite, “Argo”, totalizou três Oscars. Emocionado, Affleck falou sobre superação em seu discurso, lembrou que era apenas um garoto quando ganhou pelo roteiro de “Gênio Indomável” e não esperava reviver aquele momento. Em oposição, “Lincoln”, que era o favorito com 12 indicações, perdeu força e faturou apenas em Direção de Arte (imprudente perto do trabalho fantástico de “Os Miseráveis”) e Ator para Daniel Day Lewis.


Enquanto o astro inglês proferiu um dos melhores discursos da cerimônia, mostrando uma veia cômica inesperada, a colega Jennifer Lawrence (“O Lado Bom da Vida”), eleita Melhor Atriz, fez os agradecimentos sem o seu carisma habitual – o que deixou mais evidente a precipitada estatueta. A atual namoradinha da América é uma excelente atriz, levou o Oscar certamente por sua presença hipnótica no filme, mas frente ao desempenho assombroso de Emmanuelle Riva (“Amor”) ou a ora enérgica ora sensível performance de Jessica Chastain (“A Hora Mais Escura”), ela fica devendo. Riva perder resulta em mais uma das injustiças históricas do Academy Awards. 


Mesmo não sendo o melhor de Tarantino (até longe disso), “Django Livre” garantiu Melhor Roteiro Original e o segundo – e merecido – prêmio para Christoph Waltz. “Os Miseráveis” consagrou Anne Hawthaway como Atriz Coadjuvante e levou ainda Maquiagem e Mixagem de Som. Na lanterna, “A Hora Mais Escura”, o novo de Kathryn Bigelow e infinitamente superior ao oscarizado “Guerra ao Terror”, empatou com “007 – Operação Skyfall” em Edição de Som. O austríaco “Amor”, como previsto, venceu por Filme Estrangeiro. E, o mais fraco entre os concorrentes, “Indomável Sonhadora”, saiu de mãos vazias.  


O resultado dos selecionados ao Oscar 2013 é uma safra mediana, dividida entre ótimos filmes (“Argo”, “As Aventuras de Pi”, “A Hora Mais Escura”, “O Lado Bom da Vida” e “Amor”), e produções apenas interessantes (“Lincoln” e “Django Livre”) ou irregulares (“Os Miseráveis” e “Indomável Sonhadora”). Segundo a primeira-dama, Michelle Obama, que anunciou o prêmio máximo, são projetos inspiradores para os jovens e o que essas futuras gerações irão representar. Colocação que se faz verdadeira em alguns dos indicados. O melhor é que esses filmes, apesar de tratarem de temas tipicamente americanos, não apresentam-se patriotas. 


Soma satisfatória
A cerimônia deste ano, mais longa que a anterior, finalizou com um saldo extremamente positivo. O começo promissor de Seth McFarlane, repleto de piadas infames, deu o tom da noite - o que não o deixou imune a inúmeras críticas dos conservadores. No decorrer da premiação acabou reduzido a apenas a chamar os apresentadores de cada prêmio (censura?), mas, mesmo assim, revelou-se o melhor anfitrião dos últimos anos. Pode retornar em 2014! 


Se no ano passado, as homenagens à sétima arte e à era de ouro de Hollywood consagraram “O Artista”, desta vez, a cerimônia do Academy Awards elegeu “Argo”, que, mesmo com uma intensa trama política, comprova a força da indústria cinematográfica quando introduz em seu roteiro um plano mirabolante de resgate, executado com sucesso devido às possíveis gravações de um longa-metragem no Irã. 


“Argo” concretizou as expectativas de ser o filme do ano, até porque venceu todas as demais premiações, provando a incoerência de excluir Affleck ao menos como Diretor. O restante da lista dos agraciados também foi previsível, repetindo praticamente os nomes do Globo de Ouro. Porém, ainda assim, a confirmação de um Oscar no currículo redefine o curso dos profissionais do cinema e do que o público assistirá nas telas pelos próximos anos. Este é o poder da Academia. 

Vencedores
Filme: “Argo”
Direção: Ang Lee, por "As Aventuras de Pi" 
Ator: Daniel Day-Lewis, "Lincoln" 
Atriz: Jennifer Lawrence, "O Lado Bom da Vida"
Ator coadjuvante: Christoph Waltz, “Django Livre”
Atriz coadjuvante: Anne Hathaway, "Os Miseráveis"
Roteiro original: “Django Livre”
Roteiro adaptado: “Argo” 
Animação: "Valente"
Filme estrangeiro: "Amor" (Áustria) 
Trilha sonora: "As Aventuras de Pi"
Canção original: "Skyfall", de Adele,"007 - Operação Skyfall"
Fotografia: "As Aventuras de Pi"
Figurino: "Anna Karenina"
Documentário: "Searching for Sugar Man"
Curta de documentário: "Inocente"
Edição: “Argo”
Maquiagem: "Os Miseráveis"
Direção de arte: "Lincoln"
Curta de animação: "Paperman" 
Curta-metragem: "Curfew" 
Edição de som: "A Hora Mais Escura" e "007 - Operação Skyfall"
Mixagem de som: "Os Miseráveis"

Apostas para o Oscar 2013



Desde que o Oscar passou a escolher até dez filmes como os melhores do ano, a seleção de indicados abriu espaço para gêneros que pouco figuravam em premiações. Na cerimônia realizada no dia 24 de fevereiro, a partir das 21h30min, no Kodak Theatre, em Los Angeles, e transmitida pela Rede Globo e TNT, temmos concorrendo nas principais categorias um violento faroeste, uma fábula filosófica, um thriller de pura tensão, um grandioso musical, uma produção austríaca densa, uma biografia política, um filme de ação sobre terrorismo, um drama independente e uma sedutora comédia romântica.

O pluralismo dessa edição deve acabar disseminando as estatuetas entre os nove indicados, sem gerar um grande vencedor da noite. A expectativa é de que o resultado seja semelhante ao do Globo de Ouro, repetindo os vitoriosos nas categorias Filme (Argo), Ator (Daniel Day-Lewis), Atriz (Jennifer Lawrence), Ator Coadjuvante (Christopher Waltz), Atriz Coadjuvante (Anne Hathaway), Animação (Valente) e Filme Estrangeiro (Amor). A seguir, o CinemaX elenca as chances de cada um dos projetos que disputam o maior prêmio do cinema.


LINCOLN
Favorito na disputa com 12 indicações, Lincoln apresenta o episódio histórico em que o 16º presidente dos Estados Unidos aprova emenda constitucional para acabar com a escravidão. O principal atrativo do projeto é a personificação de Daniel Day-Lewis, fisicamente idêntico. Deve levar como Melhor Ator. Steven Spielberg também possui grande possibilide de ser consagrado como Diretor. Apesar do alto número de indicações, vencer a categoria principal é o seu maior desafio.
Deve ganhar: Diretor, Ator
Altas chances: Filme


ARGO
A história real apresentada por Argo é realmente fantástica. E pode lhe render o tão cobiçado prêmio de Melhor Filme. Na trama, um especialista da CIA executa plano mirabolante para resgatar seis americanos do Irã. O thriller de ação é habilmente conduzido por Ben Affleck, que assume como protagonista e diretor. A produção surpreendeu vencendo o Globo de Ouro de Melhor Filme – Drama e Melhor Diretor, disparando na lista de apostas do Oscar. Seu ponto fraco é a ausência de indicação para Affleck nas duas funções que exerce.
Deve levar: Filme, Roteiro Adaptado, Edição


OS MISERÁVEIS
Após a consagração de O discurso do rei com cinco Oscars, Tom Hooper poderia escolher o projeto que quissesse. A decisão foi adaptar o clássico de Vitor Hugo, Os miseráveis, que também ganhou versão musical na Broadway. As oito indicações podem converter em estatuetas principalmente nas categorias técnicas. Anne Hathaway é a aposta certeira como Atriz Coadjuvante e Hugh Jackman é o único capaz de ameaçar o favoritismo de Daniel Day-Lewis na categoria de Melhor Ator.
Deve ganhar: Atriz Coadjuvante, Direção de Arte, Mixagem de Som, Maquiagem
Altas chances: Ator


AMOR
O estranho no ninho desta vez é Amor, produção austríaca de Michael Haneke que figura como o único exemplar não americano entre os indicados a Melhor Filme. Este drama sobre um casal de idosos frente as fragilidades da morte arrecadou diversos prêmios, incluindo a Palma de Ouro em Cannes. A consagração como Melhor Filme Estrangeiro é óbvia. Em contrapartida, ainda resta a dúvida se Emmanuelle Riva ganha como Atriz. Se não acontecer, será mais uma das grandes injustiças da história da premiação.
Deve ganhar: Filme Estrangeiro
Altas chances: Atriz e Roteiro Original


INDOMÁVEL SONHADORA
Indomável sonhadora está longe de ser uma obra-prima, mas tem seu mérito ao revelar dois talentos: o do competente cineasta Benh Zeitlin, que explora uma triste realidade pouco vista no cinema americano, e da expressiva menina de nove anos, Quvenzhané Wallis. Ambos estão concorrendo, respectativamente, nas categorias Diretor e Atriz. Com poucas chances de vencer, este drama independente deve se contentar apenas em ser indicado.


DJANGO LIVRE
O faroeste de Quentin Tarantino aproveitou o hype provocado por Bastardos inglórios e conquistou cinco indicações da Academia. Sem a nomeação para Melhor Diretor, Django livre perdeu sua força na disputa. Configura ameaça nas categorias Roteiro Original e Ator Coadjuvante, esta última com a poderosa atuação de Christopher Waltz.
Deve ganhar: Ator Coadjuvante, Edição de Som e Roteiro Original


O LADO BOM DA VIDA
Uma equipe em perfeita sintonia é a fórmula do sucesso de O lado bom da vida. A comédia romântica sobre dois adultos traumatizados que se apaixonam não apresenta nada surpreendente em sua história, mas compensa pelo desempenho impecável do quarteto Bradley Cooper, Jennifer Lawrence, Jacki Weaver e Robert DeNiro – todos merecidamente indicados. O resultado é fruto do trabalho do diretor e roteirista David O. Russel, que também está no páreo. Jennifer Lawrence é a preferida como Atriz.
Deve ganhar: Atriz
Altas chances: Ator Coadjuvante (Robert DeNiro)


A HORA MAIS ESCURA
Kathryn Bigelow foi catapultada para o primeiro time de Hollywood depois que levou o Oscar de Melhor Diretora por Guerra ao terror. A ex-esposa de James Cameron preferiu seguir filmando no Oriente Médio em seu próximo projeto, A hora mais escura, que relata a caçada ao terrorista Osama Bin Laden. Dessa vez, o filme de Bigelow deve sair de mãos vazias.


AS AVENTURAS DE PI
Adaptação do livro homônimo de Yann Martel, As aventuras de Pi conquistou notoridade entre os lançamentos de 2012 não apenas por sua parcela de entretenimento, mas também por ser uma bela fábula que discute a sobrevivência e a filosofia. O resultado primoroso de Ang Lee no comando da narrativa e os quesitos técnicos, como a exeburante fotografia, podem render alguma estatueta.
Deve ganhar: Fotografia, Trilha Sonora, Efeitos visuais
Altas chances: Diretor


Fora dos nove principais:
Animação: Valente
Canção Original: 007 – Skyfall
Figurino: Anna Karenina

Crítica: O Lado Bom da Vida



Exemplares de comédia, terror e ação não costumam figurar em listas de premiações. O drama, geralmente, é o gênero favorito às láureas. Portanto, quando uma comédia romântica conquista oito indicações ao Oscar, é preciso ficar atento a esse campeão. “O Lado Bom da Vida” deve boa parte de seu mérito ao elenco inspirado e, também, ao comando competente do diretor. Além disso, um elemento-chave: personagens fora do controle, atípicos à cartilha tradicional do gênero. O filme de David O. Russel é uma história que você provavelmente já assistiu, porém, apresentada de forma madura, verdadeira e detentora de um charme irresistível.

A trama, baseada no livro homônimo de Matthew Quick, gira em torno de Pat  (Bradley Cooper), um professor de História que surta após flagrar a esposa o traindo com um colega do trabalho. Ele é diagnosticado bipolar, internado em um hospital psiquiátrico por oito meses e, após receber alta, volta a morar com o pai (Robert DeNiro) e a mãe (Jacki Weaver). Pat pretende recomeçar sua vida, mas encontra-se obcecado em ter de volta o amor da esposa. É perdido nessa missão de reconquista que ele conhece Tiffany (Jennifer Lawrence), uma garota de sua vizinhança que recentemente ficou viúva e também passou por um período sombrio. A afinidade entre eles surge justamente a partir dos traumas compartilhados.

Pat e Tiffany são dois adultos que perderam o equilíbrio frente a situações estressantes. Tornam-se amigos ao dividir suas experiências. E, aos poucos, percebem que são feitos um para o outro. São essas figuras complexas e reais que salvam o filme do trivial, personagens valorizados pela surpreendente atuação de Bradley Cooper (“Se Beber, Não Case”) como o maníaco depressivo e a perfomance sexy e hipnótica de Jennifer Lawrence (“Jogos Mortais”), vencedora do Globo de Ouro 2013 como Melhor Atriz.


Para unir esse casal disfuncional, nada melhor que divertidas (e reveladoras) aulas de dança. Alguma dúvida de que o filme terminará em uma competição esportiva? Esse é apenas um dos clichês presentes no roteiro. “O Lado Bom da Vida” não se importa que muitas cenas clássicas do gênero estejam no pacote. Seu ponto forte é tornar esses momentos verdadeiros. Escolhas acertadas de David O. Russell, um cineasta que se reinventou nos últimos anos, e que repete o feito de seu projeto anterior, “O Vencedor”, em que transformou uma história tradicional num potente e prazeroso entretenimento.

Nota: 7,9

Crítica: Lincoln



Depois das críticas ao exagero e didatismo de “Cavalo de Guerra”, Steven Spielberg avançou por um caminho mais seguro no drama histórico “Lincoln”. Ao enveredar pela vida do 16º presidente dos Estados Unidos, preferiu dar destaque à principal causa defendida pelo republicano: a abolição da escravatura. O filme não é necessariamente uma cinebiografia do personagem, revela-se um episódio altamente político da aprovação da 13ª emenda à Constituição e o fim da guerra civil, momentos marcantes para a transformação da América.

Entre jogos de poder e burocracias políticas, Abraham Lincoln negocia e utiliza até da corrupção para dar fim aos seus objetivos. São necessárias duas horas e 30 minutos para a produção concretizar na tela o feito tão importante que o presidente almeja. O conteúdo político torna a exibição em diversos momentos cansativa, mas o peso não interfere na construção desse belo exemplar de um registro histórico. A direção de arte retrata o período com perfeição, assim como o primoroso trabalho de maquiagem em Daniel Day-Lewis para torná-lo idêntico à figura pública que representa.

Como já não é novidade, o ator brilha em cena, principalmente, quando relata histórias e casos particulares como analogias para reafirmar seu ponto de vista em discussões. O esforço do ator mais uma vez impressiona. Porém, o que não encontra equilíbrio durante a sessão é como o roteiro trata a imagem do presidente, resumindo-o como um senhor bonzinho, fraco, cansado e com uma causa que o deixa inquieto. A fala lenta de Lincoln impede um rompante com verve de Day-Lewis, o que deixa a representação do personagem distante de uma demonstração poderosa da responsabilidade que está nas suas mãos.

Spielberg, que já havia trabalhado com o tema da escravidão em “Amistad”, comanda o projeto com pulso firme. Não há sentimentalismos e ode à nação. Uma oportunidade para conhecer o homem que promoveu o progresso humano em uma época de preconceitos. “Lincoln” aborda em essência a luta pela liberdade e o sentido de democracia, dentro de sua abordagem verídica.   

Nota: 7,2