Medianeras


Uma boa surpresa chega do cinema argentino. O filme "Medianeras - Buenos Aires na Era do Amor Virtual" mostra dois jovens solitários, vizinhos de prédio, aparentemente tão próximos, porém, separados por uma grande metrópole. Ambos vivem trancafiados em seus apartamentos; presos em espaços minúsculos, de apenas uma janela e isolados do que acontece fora de suas zonas de conforto. Frustrações e expectativas de vida são desenhadas pelos personagens durante o filme, tornando o retrato desses jovens adultos tão fiel à realidade.

Martin mal sai de casa. É criador de sites e passa horas em frente ao computador. Suas interações com outras pessoas são, praticamente, mediadas pelo virtual. Após alguns ataques de pânico, seu médico recomenda caminhar pela cidade e fotografar o que achar interessante. Uma receita para aliviar o estresse e também para conviver além do seu universo de quatro paredes.

No prédio ao lado, mora Mariana, arquiteta que não conseguiu tirar uma de suas plantas do papel. Em compensação, trabalha como decoradora de vitrines de lojas. Ela recém terminou um relacionamento de quatro anos e está se adaptando a viver sozinha em seu antigo apartamento. Possui claustrofobia e sobe e desce diariamente oito andares de escada. Os dois formam um casal de personalidades e gostos similares que ainda não se conhece.

Como pano de fundo, temos Buenos Aires como uma cidade esmagadora, formada por uma infinidade de prédios de diversos tamanhos e formatos, habitados por pessoas cada vez mais individualistas e, consequentemente, sozinhas. Aquela imagem de capital turística e cultural não aparece em cena, oferecendo a oportunidade de representar qualquer outra metrópole mundial. A tal “medianeira” do título refere-se ao lado cego dos prédios, sem janelas, geralmente utilizado para propagandas. É assim como os personagens se sentem perante o mundo: uma pequena parte aprisionada.

As duas histórias correm em paralelo, ameaçando uma fusão que pode ou não ocorrer ao final. Nesse caminho, Martin mostra-se um personagem bem mais interessante. Ele procura alternativas de movimentar sua vida, chega a conhecer algumas garotas; enquanto Mariana sucumbe à depressão e permanece em um pseudo-luto.

O uso excessivo de narrações deixa à mostra sua origem em curta-metragem. O diretor Gustavo Taretto ganhou diversos prêmios em 2005 com a primeira versão. Agora, ao extendê-la, acaba se alongando demais em certos momentos e diminui o ritmo, mas em outros consegue criar fusões inteligentes que conectam a vida desses dois protagonistas de maneira criativa. E é nesse câmbio de informações que "Medianeras" captura com sensibilidade o que é morar em uma metrópole, sendo sempre verdadeiro com os Martins e as Marianas que existem por aí.

Nota: 8

Jovens Adultos

O diretor Jason Reitman e a roteirista Diablo Cody, a dupla responsável pelo sucesso indie "Juno", voltam a trabalhar juntos na comédia de humor negro "Jovens Adultos". Se o resultado do primeiro foi surpreendentemente positivo – levou o Oscar de Melhor Roteiro Original –, desta vez a parceira soa um pouco desconexa. Embora, não deixe de ser um filme de momentos interessantes.

"Jovens Adultos" é sobre Mavis Gary (Charlize Theron), uma escritora/roteirista que atua como "ghost writer" de uma série de livros infantis. Quando a saga é cancelada, ela decide voltar para sua cidade natal, onde era a garota mais popular da escola, e tentar reconquistar seu ex-namorado que atualmente está casado e recém ganhou um filho.

O filme recheado de ironias e cinismos mostra o trágico retrato de uma ex-rainha de baile de escola americana. Mavis é amarga, malvada, alcoólatra e, acima de tudo, egoísta. Por ser bela e popular, desenvolveu uma superioridade que não se sustenta mais. Ela é uma pessoa problemática, insatisfeita com a vida, justamente porque esta não se transformou em um conto de fadas.

Charlize tem em Mavis uma de suas melhores interpretações. Abandona o glamour e encara uma personagem difícil. Sua indicação ao Globo de Ouro em Melhor Atriz – Comédia ou Musical foi mais que merecida. As melhores cenas da controversa escritora são com Matt, um nerd que ela zombava na escola. Também no elenco, como par romântico, o competente Patrick Wilson.

O principal mérito do roteiro de Diablo Cody é não trair seus personagens. Mavis não tem uma redenção por suas atitudes. Ela está buscando a sua felicidade, independente de qual maneira, e, por mais que ela procure mudar, vai seguir cometendo erros. Em compensação, o que falta em "Jovens Adultos" é mais relevância. Por vezes, esse discurso absurdo da protagonista chega a soar vazio.

Com um roteiro levemente frágil, a direção tenta compensar com tomadas divertidas, como a abertura com rock´n´roll e imagens de uma fita cassete. Jason tenta explorar a história, mas sem sucesso. O lamento, ao final, é de que o cineasta chegou ao topo com "Amor Sem Escalas" e depois caiu com este exemplar aqui. A dupla que se encontrou tão bem em "Juno" não correspondeu à altura dessa vez.

Nota: 7

O Preço do Amanhã

Chegar aos 25 anos e parar de envelhecer. Um desejo de praticamente todos mortais. Com essa premissa, “O Preço do Amanhã” apresenta um futuro em que a moeda é o tempo. Os humanos ao atingirem essa idade possuem apenas mais um ano de vida - a menos que paguem pelo tempo extra. A idéia remete aos contos de Phillip K. Dick (autor de “Minority Report”, “O Homem Duplo”, “O Vingador do Futuro”, dentre outras ficções científicas), o que é um bom sinal, mas perde o rumo quando vira um filme de ação descerebrado.

Justin Timberlake, que pelo jeito abandonou a carreira de cantor, interpreta Will Saalas, um típico funcionário do sistema até receber uma doação que lhe permite viver por um século. Acusado de matar para conseguir essa quantia, ele é perseguido pelos “guardiões do tempo”, a polícia do futuro. Na perseguição, sequestra a filha de um magnata (Amanda Seyfreid) e, juntos, tentarão mudar a realidade injusta.

Após construir com cuidado o primeiro ato, o diretor Andrew Niccol ("O Senhor das Armas") larga de mão a narrativa para investir nas cenas de fuga. O que resta da história nesse momento é a transformação do protagonista em um Robin Hood moderno. O potencial de uma ficção científica inteligente e de presença é desperdiçado em um acúmulo de cenas de explosão, deixando claro a intenção de ser uma peça de puro entretenimento.

Se o desenvolvimento seguisse na parte que deu mais certo, “O Preço do Amanhã” poderia se equivaler às adaptações de Phillip K. Dick para o cinema. Do jeito que termina, o filme demonstra ser uma criação completa de Niccol (também autor do roteiro), com uma idéia criativa apenas para alavancar um projeto de ação.

No meio da correria, a química entre Timberlake e Seyfreid não chega a pegar fogo. Enquanto ele está mais uma vez ótimo no personagem, ela permanece o filme todo com uma expressão blasé. Se a dupla não funciona tão bem junta é porque interage justamente nesta segunda parte pouco inspirada. Apesar da caída perto do final, “O Preço do Amanhã” ainda consegue se safar como uma aventura futurística interessante e em parte original.

Nota: 7

Gainsbourg


A figura de Serge Gainsbourg por si só é fascinante. Ele era um boêmio irrecuperável, viciado em cigarros, bebidas e mulheres. Apesar de feio, atraia as amantes mais lindas, inclusive a belíssima atriz Brigitte Bardot. Durante sua trajetória colecionou escândalos e compôs músicas para inúmeros artistas. Em 2010, o cantor ganhou uma cinebiografia a fim de capturar a história de sua vida desde a infância durante a guerra até sua morte em 1991. Infelizmente, o filme tem um roteiro relapso e não faz jus a um dos maiores nomes da música francesa.

O roteiro de “Gainsbourg – O Homem Que Amava as Mulheres” é o principal culpado desse infeliz resultado. Tem como linha condutora a aparição de certos “fantoches humanos” que conversam com o protagonista, geralmente uma versão dele próprio representada por um ser com orelhas, mãos e nariz gigantes. A utilização desses “bonecos” não deixa de ser um artifício preguiçoso para expressar os sentimentos do personagem principal. São cenas que diminuem e enfraquecem a obra. Além disso, a narrativa é tão mal desenvolvida que atropela constantemente acontecimentos importantes e se estende em bobagens, como essas criaturas.

O problema da trama contamina até mesmo a atuação de Eric Elmosnino. Por mais que tente, o ator não consegue transmitir uma verve ao nível do ídolo da música, principalmente porque o roteiro estraga por inteiro o crescimento do personagem. Assim, o Gainsbourg não é nem ao menos carismático. “O Homem Que Amava as Mulheres” apenas ganha uma sobrevida quando aparece em cena Laetitia Casta como Brigette Bardot. Mas, com a saída dela de cena, o longa volta ao seu completo desastre.

Nota: 2

Melhores Filmes de 2011

O Blog CinemaX escolheu os cinco melhores filmes lançados em 2011 - todos imperdíveis, é claro. De diretores consagrados, como Allen e Almodóvar, passando por filmes cult e crítica política produzida por Hollywood, até uma comédia romântica deliciosa. Ao final, alguns destaques do ano que mercem a sua locação e, também, aqueles que você deve evitar. Anote as dicas e uma boa sessão de cinema!

1°) MEIA-NOITE EM PARIS



Subestimado na última década, o gênio Woody Allen entregou uma obra-prima para calar a boca de todos que duvidavam do seu retorno ao topo. Se filmes brilhantes, como “Match Point”, “Vicky Cristina Barcelona” e “Tudo Pode Dar Certo”, não chegaram a convencer parcela do público e crítica, “Meia-noite em Paris” foi implacável em arrecadar elogios. Recebeu 12 prêmios, incluindo Melhor Roteiro no Oscar e Globo de Ouro, e tornou-se uma das maiores bilheterias do diretor. A trama sobre um escritor fracassado que “viaja no tempo” para uma Paris dos anos 20, de encontros com grandes artistas do passado, encantou gerações saudosistas.

2°) A PELE QUE HABITO


Quando Almodóvar anunciou que seu próximo filme seria baseado em um livro de terror, a possibilidade de que errasse a mão era grande. Ao fugir de sua zona de conforto, um thriller não parecia um terreno confiável a se aventurar. Ao contrário do que aparentava, o diretor imprimiu seu gosto pelo melodrama na adaptação dessa surpreendente história e transformou “A Pele Que Habito” em um de seus filmes obrigatórios. Polêmico, belo e chocante, é Almodóvar em grande estilo – apenas mais tenso que o habitual.

3°) AMORES IMAGINÁRIOS


Xavier Dolan é invejado por qualquer aspirante a cineasta. O ator e diretor canadense lançou seu primeiro longa-metragem, “Eu Matei a Minha Mãe”, com apenas 20 anos. O filme levou 27 prêmios mundo à fora. Um ano depois, filmou “Amores Imaginários”, uma pequena obra-prima, de uma beleza estética absurda, respirando o significado de “cool” em cada frame. A trama é um pouco batida, sobre dois jovens – um homem e uma mulher – disputando o amor de um rapaz. Mesmo assim, é puro deleite apreciar cada vez que toca em cena a interpretação de Dalila para o clássico “Bang Bang (My Baby Shot Me Down)”.

4°) TUDO PELO PODER


O drama político “Tudo Pelo Poder” foi esquecido pelo Oscar, provavelmente por não ser tão pró-Estados Unidos, mas merece devido destaque entre os melhores do ano. Filmes com forte teor político tendem a ser chatos para o grande público - geralmente leigo no assunto -, mas este aqui empolga desde o início, sem criar um nó na cabeça do espectador. Dirigido e estrelado por George Clooney, o longa aprofunda-se nos podres de uma campanha eleitoral. Conta ainda com um elenco repleto de astros, alavancado pelo ator do momento, Ryan Gosling (ótimo). “Tudo Pelo Poder” é, acima de tudo, poderoso.

5°) AMIZADE COLORIDA


“Amizade Colorida” estar entre os cinco melhores pode ser uma surpresa para muitos. Porém, o motivo é que esta é a melhor comédia romântica produzida por Hollywood em anos. Os diálogos inteligentes e a química da dupla protagonista criam a empatia imediata. A trama não aposta em clichês e procura se reinventar, criar referências e ser atual ao mesmo tempo. É diversão de qualidade pouco assistida nas telas.

Destaques: Guerreiro, Drive, 50%, Missão Madrinha de Casamento, Hanna, Uma Noite Mais Que Louca, Um Novo Despertar, Cavalo de Guerra, O Homem Que Mudou o Jogo

Piores do ano: Hesher, Amor, Felicidade ou Casamento, Quero Matar Meu Chefe, Se Beber, Não Case – Parte II, Um Dia

Sete Dias com Marilyn


Juntamente com “O Artista” e “A Invenção de Hugo Cabret”, o biográfico “Sete Dias com Marilyn” é mais um concorrente do Oscar 2012 que aborda o cinema do passado. Desta vez, não chega a ser uma homenagem, mas funciona como um retrato de uma estrela problemática no auge de sua carreira. Michelle Williams, que não é nada parecida com a atriz, convence como uma Marilyn frágil, deslumbrante, insegura, encantadora e de um talento natural para os filmes.

A história de “Sete Dias com Marilyn” é baseada no livro de Colin Clark, um dos personagens do filme. Na época, ele era um jovem de 24 anos que consegue a oportunidade de trabalhar como terceiro assistente de produção em um projeto no qual Marilyn é a atriz principal. O que seria uma experiência profissional, termina como uma catarse de sentimentos, já que, ao contrário do esperado, o rapaz acaba se envolvendo com uma das maiores estrelas do mundo .

O longa-metragem de Simon Curtis, diretor conhecido por filmes britânicos, acompanha principalmente os bastidores da produção. Apenas peca por um recheio levemente cansativo, mas inicia e arremata sua obra com precisão. Além dos elogios a Michille Williams e suas caras e bocas idênticas à Marilyn, o elenco de apoio também é excepcional: Kenneth Branagh, Judi Dench, Julia Ormond, Toby Jones, Dominic Cooper e Emma Watson – sem falar em Eddie Redmayne, que demonstra amadurecimento na sua atuação como o protagonista apaixonado.

Nota: 7,7

A Invenção de Hugo Cabret


Difícil imaginar Martin Scorsese à frente de uma adaptação infanto-juvenil. As dúvidas sobre qual seria a contribuição do diretor famoso por seus filmes violentos ao universo das crianças pipocavam até o lançamento do novo projeto. E de forma positiva, Scorsese correspondeu com um comando interessante, valorizando o tom de fábula da história e apostando em uma direção de arte impecável, que lembra a atmosfera dos contos natalinos. O único entrave de “A Invenção de Hugo Cabret” é toda parte que não realiza uma homenagem ao cinema.

O filme pode ser dividido em dois atos ou duas tramas. Temos a narrativa principal sobre um órfão que mora em uma estação de trem em Paris e tenta desvendar um mistério deixado por seu pai; e, em paralelo, temos a história verídica do cineasta Geórge Méliès. Enquanto a primeira é uma trama bonitinha, mas banal, a segunda é tão poderosa que praticamente carrega o filme nas costas.

As duas tramas ao invés de encontrarem uma sintonia acabam por rivalizar, deixando visível o abismo existente entre elas. Parecem dois filmes separados. A primeira hora de duração foca-se na história do garoto, por isso é tão tediosa. Quando inicia o relato sobre Méliès, o filme ganha um novo fôlego e melhora consideravelmente. Esse novo contexto faz referência a uma série de produções do início do cinema e ainda recria de forma fascinante os sets do clássico “Viagem à Lua”.

“A Invenção de Hugo Cabret” não chega a ser um filme para crianças. Pode até ser assistido e desfrutado por elas, mas guarda em seu segundo momento a essência do projeto: uma homenagem à sétima arte deliciada principalmente pelos adultos. E nesse conjunto ainda introduz um discurso importante sobre a preservação das obras cinematográficas. Embora esteticamente perfeito e com uma trama geral bonitinha, o filme deixa aquele gosto de que poderia ter sido bem mais proveitoso se o foco desde o início tivesse naquele que enxergou potencial nos filmes. “Hugo”, em seu melhor, é uma exaltação ao homem que transformou o que era documental em fantasia! Viva Méliès!

Nota: 7,9

O Abrigo


Curtis é um homem comum. Trabalha para uma empresa de extração de areia em uma cidade do interior de Ohio. Tem uma bela esposa e uma filha com problemas de audição. A vida pacata começa a apresentar tons de mudança quando ele começa a ter sonhos cada vez mais perturbadores. Como se isso não bastasse, Curtis passa a acreditar que uma tempestade de proporções gigantes está se aproximando e, para se prevenir, decide reativar o abrigo de sua casa. Estaria ele ficando louco ou suas previsões de um final apocalíptico irão se confirmar? Com essa pergunta inquietante sobre o que acontece na tela, “O Abrigo” conduz sua curiosa história até um desfecho de muitos significados.

O diretor Jeff Nichols, que também assina o roteiro, imprime um ritmo lento para esse thriller psicológico independente. Sua narrativa bem construída aprofunda as relações de Curtis com a família e o trabalho, ao mesmo tempo que demonstra sua obsessão com a construção do espaço subterrâneo no quintal. As boas atuações do casal principal, Michael Shannon e Jessica Chastain, contribuem com a situação ao qual o casal será exposto. Dessa forma, intrigante e coeso, “O Abrigo” termina como um filme bastante interessante sobre um homem atormentado.

Nota: 7


Interpretação quanto ao final de “O Abrigo”: Se você não quer saber spoilers, não leia a seguir. São muitas versões sobre o final do filme, mas minha interpretação descarta qualquer cunho apocalíptico da trama. Considero verdadeiro apenas o suporte psicológico. A começar com Curtis apresentando os primeiros sinais da esquizofrenia. São ilusões e alucinações, personificadas pela tal tempestade gigante. Ela nada mais é que a representação de sua doença. Para fugir dela, ele constrói um abrigo, tendo-o como um lugar seguro, longe da loucura. Quando ele sai do abrigo, após ficar horas com sua esposa e filha lá dentro, Curtis acredita estar curado. Assim como sua esposa faz esforços para ele superar a doença e acredita que ele conseguiu. Mas, o decreto vem mesmo do médico, que aconselha tratamento exclusivo devido a gravidade da situação. Antes de ingressar nesse processo, ele vai com a família para praia. E é justamente aí que vem uma tempestade forte. E ele não tem o seu abrigo. Isso significa que a doença veio para ficar, é real e ele vai ter que enfrentá-la de qualquer jeito.