Crítica: O Voo



Os acontecimentos de “O Voo” são tão passíveis de ocorrer fora da tela que o filme poderia receber o selo de “baseado em uma história real”. Na trama do novo filme de Robert Zemeckis (“Forrest Gump”, “Náufrago”), o piloto de avião Whip Withaker, interpretado por Denzel Washington, depara-se com uma falha mecânica que provoca o mergulho em queda livre da aeronave. Withaker consegue, através de uma manobra surpreendente, salvar boa parte dos passageiros. O feito louvável o transforma em herói americano. Entretanto, um exame de sangue posterior ao acidente comprova a existência elevada de álcool no organismo do piloto. Withaker dirigiu o avião embriagado. 

A partir desse ponto, o filme desenvolve questionamentos éticos sobre a possível culpa do comandante quanto à morte de quatro passageiros e dois tripulantes, decorrentes da aterrissagem forçada. A problemática, que poderia facilmente ser um acontecimento verídico, é mais complexa do que se pode julgar de imediato. Assim, o roteiro explora dualidades essenciais, como por exemplo: ao mesmo tempo que demonstrou ser um excelente piloto, evitando o provável desastre aéreo, Withaker também recebe repreensões por sua conduta, que, caso não estivesse alcoolizado, poderia ter salvo mais pessoas. Será?

Em uma de suas melhores atuações, Washington assume o personagem com um desempenho irretocável, apresentando-o de forma humana, na oscilação entre as faces de farrista, ameaçador, arrependido e bêbado. O ponto máximo é o seu depoimento durante o tribunal de acusação. Completam o elenco, os competentes Don Cheadle, Tamara Tunie, Melissa Leo e James Badge Dale, em ponta marcante como um paciente terminal. 

A narrativa de “O Voo” desenvolve-se em dois períodos. O início é de ação, com as cenas sufocantes do acidente - este que é peça fundamental para os futuros acontecimentos. O restante do filme avança pelo drama, com direito a uma subtrama desnecessária, que envolve Kelly Reilly como uma drogada. De tão descartável, a atriz nem aparece no trailer do projeto. Porém, o roteiro insiste em torná-la importante, colocando seus momentos intercalados, inclusive, com o que ocorre no interior do avião. Essa tentativa de par romântico serve apenas para aumentar a duração do filme.  

Zemeckis comanda o espetáculo com a experiência de veterano no cinema, valorizando o que seu projeto tem de melhor: a atuação do protagonista, a tensão do acidente, o questionamento ético e a aceitação do alcoolismo. Mesmo com os últimos minutos tendendo a uma lição de moral e frases de efeito/clichê, “O Voo” consegue um resultado excepcional ao apresentar um caso polêmico que, ao invés de dividir opiniões, deixa o espectador com dificuldade de escolher um lado. 

Curiosidade
O longa-metragem inspirou-se no fato verídico ocorrido em 2000, em que um avião rumo a Chicago, repentinamente, mergulhou em direção ao solo. O piloto precisou colocar a aeronave de “cabeça para baixo” a fim de estabilizá-la. Ao contrário do filme, o pouso não foi bem-sucedido. Nenhum passageiro sobreviveu.

Nota: 7,8

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